Antes de pesquisar e realizar essa viagem, não imaginava que a Colômbia era um destino bastante comum para brasileiros. Cheguei a ler que, em San Andrés, os visitantes estrangeiros em maior número são brasileiros. Sendo assim, esse texto vai servir não somente para que eu possa relembrar a viagem daqui a uns anos em linguagem escrita, mas também para quem pretende seguir roteiro semelhante ou acompanhar algumas dicas (inclusive de erros que cometemos) que podem ser importantes para brasileiros que vão visitar algum dos locais em que estivemos na Colômbia. Ficamos 4 dias em San Andrés, 4 dias em Cartagena e 3 dias em Bogotá. Está interessado? Já adianto, prepare as perninhas e o coração para aventuras e encantamentos. Há muitos lugares para conhecer.
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La Piscinita, a não-oficial (San Andrés) |
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Nossa saga para chegar à Colômbia começou pegando um ônibus até a rodoviária de Belo Horizonte (6h de estrada). De lá fomos para o aeroporto de Confins em outro ônibus (1h30 de percurso). O avião partiu à 1h40 da madrugada com destino à Cidade do Panamá (6h40 de voo), onde tínhamos que realizar uma conexão. Depois, a viagem continua em outro avião até Bogotá (1h35 de voo). De Bogotá a San Andrés, havíamos comprado uma passagem de avião separada. Foram mais 2h15 de voo até a ilha.
Foi bastante cansativo viajar de ônibus até Belo Horizonte, ficar esperando algumas horas na rodoviária e depois mais algumas horas no aeroporto até o avião partir. Contudo, mais cansativo foi atravessar a madrugada inteira em voo (ao menos para mim, que não consigo dormir em poltrona de avião) e, ainda, pegar outro avião até San Andres. Teria sido menos cansativo (e talvez mais barato) se tivéssemos ido de carro próprio até o aeroporto de Confins e deixado lá estacionado? É provável. Mais uma lição aprendida. Além do cansaço, próximo a chegar na Cidade do Panamá, serviram no avião um lanche estranho que não me fez bem (uma versão panamenha do omelete com o tal do molho Alfredo).
Quando estávamos no aeroporto do Panamá precisamos apresentar nossos passaportes. Essa é uma informação indispensável. Invariavelmente os voos da Copa Airlines para a Colômbia estão fazendo conexão no Panamá (em razão de funcionar como entreposto dos EUA e da América Latina), um país que, por não pertencer ao Mercosul, exige passaporte de brasileiros. Se fosse direto para a Colômbia, bastaria o RG atualizado nos últimos dez anos. No aeroporto de Bogotá também apresentamos o CheckMig. Trata-se de um formulário que deve ser preenchido com 72h ou menos de antecedência, opcional, mas que agiliza o processo para entrar no país (conseguido pelo site sem custos). Lemos que a Colômbia também solicitava o cartão de vacina contra febre amarela. Conseguimos expedir esse certificado de vacinação pelo portal do governo brasileiro, mas, no entanto, não nos foi cobrado sua apresentação. Um trabalho à toa.
A passagem pela imigração colombiana no aeroporto de Bogotá foi rápida. Perguntaram por que estávamos no país, aonde iríamos e onde ficaríamos hospedados. Sim, querem saber tudo. Tínhamos imprimido as reservas dos hotéis e isso acelerou o processo. O aeroporto de Bogotá é enorme e nos perdemos suavemente até encontrar o local correto de embarque doméstico. Entretanto, estávamos com tempo e aproveitamos para tomar um desayuno no aeroporto que, surpreendentemente, não possuía preços tão abusivos quanto os dos aeroportos brasileiros. Antes de embarcar no voo para San Andrés, tivemos que pagar uma taxa de turismo para acessar a ilha. Tipo Fernando de Noronha. Mas chamam de muelle. É um imposto para desembarque nas docas/portos e vimos alguns desses para acessar outras ilhas.
Se for analisar, fizemos um ziguezague nessa viagem. A ilha de San Andrés fica mais próxima da Cidade do Panamá do que de Bogotá (na verdade fica ainda mais próxima da Nicarágua, 380km da capital). Seria possível comprar passagens diretas. Mas ficava bem mais caro. Contudo, poderíamos ter optado por aterrissar em Bogotá e conhecer a cidade para só depois ir a San Andrés. Teria sido menos cansativo, mas acho que o roteiro que fizemos foi o melhor. Primeiro San Andrés, depois Cartagena e, por fim, Bogotá. Acredito que as cidades acabaram se complementando.
San Andrés
1. Chegamos exaustos. Moídos. Só a farofinha. De táxi fomos à quitinete alugada pelo Airbnb. Não tem Uber na ilha. O táxi custa 35,00 reais para qualquer lugar central. A quitinete estava bem localizada, a uns 200m da marina e 700m da praia e tinha quarto, sala e cozinha conjugada. Fomos muito bem recebidos por Florián, dono do local. Um dos melhores anfitriões que já tivemos nessas experiências de Airbnb. Florián foi muito solícito e prestativo em todos os dias em que estivemos na ilha, inclusive nos ajudando a resolver problemas como o naufrágio do celular. Por termos chegado cansados e tarde (às 16h), decidimos fazer apenas um passeio de reconhecimento na praia e comer alguma coisa por perto. Não sabíamos da surpresa que nos aguardava.
A primeira impressão do Caribe não foi nada boa. A praia de Spratt Bright, neste sábado, talvez por se localizar no centro, estava abarrotada de gente. Uma confusão. Bebedeira. Competição de JBLs. Muito barulho. Colombianos não são muito diferentes de brasileiros. Curtem uma festa de arromba. A areia grossa e a praia, por estar cheia, não estava exatamente limpa. A beleza da cor da água nos impressionou desde o princípio. No entanto, cogitamos que já tínhamos visto coisa mais bonita e mais barata e que demandaria menos esforço para lá estarmos. Andamos um pouco pela faixa de areia e ficamos refletindo. “Ah, não. Será que é só isso?” “Amanhã deve estar melhor”. A cidadezinha de San Andrés, com exceção de uma área bastante turística, onde havia calçadões e um self service de lojinhas, me lembrou alguns bairros de Macapá. Muitas casas de madeira, sem muro ou com portões gradeados baixos, com telhados de amianto e sobrados, construções inacabadas ou abandonadas e saneamento urbano precário, às vezes com esgoto sendo lançado nas ruas. Trânsito caótico, buzinaço, com muitas motos e minibugues. Ao contrário de Macapá, as ruas eram estreitas, descuidadas, com calçadas apertadas. Ou seja, o primeiro dia de Caribe não teve nada de glamour. Nadinha.
Nesse mesmo dia, tivemos nossa primeira experiência gastronômica caribenha em um restaurante (CafeCafé) bem do lado da praia. A limonada com coco (bebida típica de lá) estava uma delícia e o frango com batata frita (pollo y papas francesas) era digno. Já o preço não foi doce. Uns 80,00 reais em um prato simples e uma bebida e foi assim que o Caribe me apresentou seu cartão de visitas em troca do meu cartão de crédito. Mas esse foi o local mais caro que comemos em San Andres. Nos outros dias encontramos boas opções mais econômicas.
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Um ponto tranquilo da praia de Spratt Bight no fim de tarde |
2. No café da manhã do dia seguinte experimentamos outro prato típico da Colômbia. Esse talvez seja o principal, pois há muitas variações: arepa. Há arepa de tudo quanto é jeito. Já conhecia a iguaria desde a Bolívia. No entanto, na Colômbia, ele é muito mais popular. Posso descrever como uma espécie de tapioca feita com farinha de milho. Nela pode ser colocado de tudo (será?). Nesse dia, comi sem nenhum recheio, porém acompanhada de ovos mexidos (huevos rancheros) e queijo. Depois, ao longo da viagem, fomos apresentados a outras inúmeras variações da arepa, umas melhores, outras piores. Li uma frase no muro de Cartagena que resume bem a relação do colombiano com o prato: “a vida é como uma arepa, é preciso saber o que colocar dentro”. De barriguinha cheia fomos para a praia pesquisar um passeio para fazer. Outra visão da praia. Estava silenciosa, limpa (na verdade estavam fazendo a limpeza do dia anterior) e mais bela. Até porque o sol rachava e contribuía com sua luz para a formação do cenaŕio onde a cor da água era a estrela principal.
Optamos por fazer o passeio do mergulho com cilindro de oxigênio. Na verdade, Ana. Eu fui como espectador e videomaker. Funciona da seguinte forma: uma van te busca no “hotel” e vai recolhendo pela cidade outros turistas com o mesmo destino que o seu. De lá vão para o sudoeste da ilha, onde a encosta não tem praia, mas rochas oceânicas. Por isso, a densidade populacional é muito menor e o mar parece ser mais calmo. Os turistas são recepcionados em uma tenda, onde explicam tudo sobre o mergulho, com uma aula de como usar o cilindro de oxigênio para descer a uma profundidade de 12 metros. O mergulho em si não dura mais do que 40 minutos e algumas pessoas passam mal por inúmeros motivos. Por causa da pressão do mar, por ter enjoo, por ter dificuldade com o cilindro, por não conseguir respirar ou soltar o ar corretamente, por temer o mar na hora do vamuvê. Eu vi isso acontecendo. Um senhor saiu com o nariz sangrando por causa da pressão. Ana teve enjôo e, como de costume em belos mares, “deu comida” para os peixinhos coloridos (leia o texto sobre nossa viagem a Maragogi). Ela saiu um pouco decepcionada por esperar ver maior diversidade da fauna marinha e também por não ter se adaptado ao peso do cilindro de oxigênio. Mas, no primeiro caso, o avançar das horas, afinal já passava das 14h, pode ter prejudicado a visibilidade (não entendo nada disso!).
Enquanto Ana frequentava a autoescola de mergulhadores, eu peguei a câmera fotográfica e saí rasgando a estradinha da encosta atrás de pássaros e de paisagens. Não encontrei muitos pássaros (uma iguana e um calango azul, sim!), porém descobri um lugar deslumbrante. Ao entrar em uma matinha, cheguei a um local onde havia rochas, cimento, uma escada e um trampolim fixo. Ao lançar o olhar para o declive pedregoso, um poço de águas verde-azuis semicristalinas preencheram de fascínio minha memória fotográfica. Foi assim que conheci La Piscinita (primeira imagem do texto ou assista ao vídeo clicando aqui). Com perdão da redundância, talvez uma das belezas naturais mais “belas” que já experienciei. Vazio, solidão e silêncio, exceto pelo motor dos bugues que passavam na estrada e das ondas suaves batendo contra as rochas. Ao levantar a cabeça, a imensidão do mar com seus vários tons de azul acabava de me entregar outro cartão de visitas do Caribe, esse, em troca apenas da passagem aérea.
3. Nesse dia, tomamos um café caseiro e seguimos para a orla da praia para alugar uma “mulita”. Uma dica turística que funciona na Colômbia é pechinchar. Principalmente no Caribe, os preços tendem a baixar. Mas afinal o que é a tal da “mulita”? Calma que não é o animal. É um veículo pequeno, de quatro rodas, aberto, sem parabrisas, 4x4, cujo nome oficial é Kawasaki Mule. Está entre um carrinho de golpe e um minibugue. Para dirigir é fácil. Não tem embreagem. Só acelera ou freia. Não passa de uns 40km/h. A buzina fica no freio de mão. É muito barulhento e comum nas ruas de San Andrés (assista ao vídeo aqui). A maioria dos turistas aluga a “mulita” para dar uma volta completa na ilha, algo em torno de 32 quilômetros. Considero que foi um dos melhores passeios que fizemos na viagem porque nos sentimos à vontade para parar onde queríamos pelo tempo que gostaríamos. No final do dia, é preciso devolver o veículo com o tanque cheio.
Depois de vencer parte da confusão do trânsito nas áreas mais movimentadas da ilha, paramos em Sarie Bay Park. Não estranhem, muitos nomes de lugares em San Andrés estão em inglês devido à peculiaridade da colonização da ilha. Acontece que as ilhas caribenhas da Colômbia (San Andrés, Providência e Santa Catalina) não eram habitadas fixamente antes da chegada dos europeus (há registros somente da presença do povo miskitu em atividades esporádicas de pesca marinha). Contudo, os espanhóis, embora tenham sido os primeiros a conquistar estas ilhas, não se preocuparam em ocupá-las e defendê-las com a devida atenção. Foi aí que, diante de uma rusga com a Espanha, os ingleses se aproveitaram para colonizar, contando com a ajuda (veja só!) de um pirata. O pirata Morgan era um corsário galês que, a mando de governantes do Reino Unido, ficou encarregado pelo controle das ilhas do Caribe (especialmente da Jamaica, de onde chegou a ser vice-governador). Chegaram puritanos ingleses na ilha por volta de 1630, oriundos da ilha de Barbados e da Inglaterra. Na mesma época, aportaram africanos escravizados que inicialmente estavam na Jamaica, a fim de que produzissem algodão e tabaco. Somente no final do século 18, a Espanha conseguiu retomar a posse sobre a ilha. Mas algumas décadas mais tarde ela seria incorporada ao território da Colômbia (inicialmente Nova Granada, incluindo os atuais Panamá, Equador e Venezuela) no desfecho das guerras de independência. Por esse breve resumo de história, já dá para imaginar o sarapatel cultural que é San Andrés. A população é quase totalmente negra. A etnia predominante é chamada de raizal. Lá falam espanhol, inglês e também a língua crioula própria de San Andrés, que consiste em uma adaptação do inglês com mistura de expressões em espanhol e de línguas africanas. Há igrejas batistas e presbiterianas e em algumas os cultos são em idioma crioulo. Outra característica que percebi da época colonial são os uniformes das crianças nas escolas. Mesmo sob o calor escaldante do Caribe, usam roupas semelhantes às do passado inglês ou espanhol. Mas chega de história e vamos voltar para o rolê.
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Ana desfocada segurando o chapéu em Sarie Bay Park |
Sarie Bay Park é um parque ou um estacionamento? Fiquei na dúvida. De todo modo, tem um estacionamento e uma pista de patins. Mas o mais interessante é poder ficar próximo às rochas oceânicas (já que San Andrés é uma ilha de corais), contemplando o azul do mar, o bater das ondas e o vento forte. Venta para caramba quase o tempo inteiro e tem furacão no meio do ano. Da “baía da Sarinha” (noroeste da ilha), resolvemos voltar e pegar o outro caminho, sentido leste, para conhecer, primeiro, as praias. Vou destacar três lugares onde paramos na costa leste. O primeiro fica no bairro de San Luis. Adentra-se nas ruas estreitas até chegar a um calçamento para pedestres. Lá, o local silencioso e desértico te concede uma bela visão do mar. A faixa de areia não era mais larga do que a da praia de Spratt Bight, mas, sem dúvidas, estava mais limpa e mais clara, assim como as cores da água, que me lembravam alguma coisa da região da praia dos Carneiros, em Pernambuco.
Seguindo adiante, também no bairro de San Luis, paramos em um local que chamam de Playita para bebes (vídeo aqui). A barreira de arrecifes fica bem próxima da areia da praia, o que produz uma espécie de piscina, bem rasa, que pode ser usada tranquilamente por todos, inclusive por crianças pequenas. Daí o nome. Mas atenção na dica, mesmo nesse lugar, é importante usar sapatilhas para entrar na água ou andar na areia, em razão da grande presença de corais e animais marinhos, como ouriços, que podem machucar seus pies descalzos. Havia algumas pessoas fazendo mergulho com esnórquel e Ana, como entusiasta do “mergulhamento frenético”, se lançou entre os arrecifes mais à frente para ver o que encontrava. Voltou logo depois para informar que havia visto peixinhos coloridos e que gostaria de filmá-los com o celular. Erro fatal. Não nos lembramos dos experimentos de física, no Ensino Fundamental, que demonstravam a capacidade da água salgada em conduzir corrente elétrica e potencialmente provocar curto-circuito em um equipamento eletrônico. Ela gravou uns 30 segundos e o colorido dos peixinhos logo deu lugar à escuridão da tela. O celular não ligava mais. Ela já havia utilizado esse Samsung s20FE embaixo d’água. Porém em água de piscina. Daí em diante ela foi obrigada a fazer um detox de celular em San Andrés porque o preço do conserto era mais salgado do que água que havia danificado o dispositivo.
No extremo sul da ilha paramos na frente de um restaurante que ficava próximo ao Hoyo Soplador. Nossa intenção era almoçar nesse restaurante e depois conhecer o tal Hoyo Soplador. Antes de descermos da mulita, fomos abordados por uma moça que disse que não poderíamos estacionar ali a menos que pagássemos uma taxa ou fizéssemos o consumo de alguma coisa. Justificou que aquilo era para ajudar a comunidade, pois sobrevivem disso. Justo. No entanto, consideramos a abordagem dela um tanto quanto agressiva. Mas tudo bem. Fomos ver os preços e as opções do restaurante (que, por sinal, era bem simples) e não agradaram. Para manter o carro estacionado, tivemos que comprar uma bebida. Pedi uma limonada de coco que custou 35,00 reais. Nem estava bom. Claro estava que havíamos sido assaltados. Dias atrás, pagamos 19,00 reais na mesma bebida no badalado CafeCafé. A moça então nos levou para ver o Hoyo Soplador. Na realidade, ela andou uns vinte passos e apontou, como se dissesse: “é ali, gringos otários!” Uma fila de gente estava formada para ficar em cima do Olho Soprador. Trata-se de um buraco nas rochas por meio do qual, com o bater das ondas, circula um jato de vento e às vezes água. Os cabelos levantam e é só. Não tem nada demais a não ser para enganar turistas. Portanto, minha dica é: fuja. Ou pare o carro longe do assédio turístico e vá lá ver o Hoyo Soplador, que é de graça e sem graça.
A próxima parada, já na costa oeste, que é onde não tem praia, mas, sim, rochas carbonáticas (de corais mortos), foi em La Piscinita. Honestamente, achei o lado oeste mais bonito. Não que o leste não seja. Mas o lado oeste é espetacular. Tanto pelas rochas quanto pela cor da água. Percebi, depois, que La Piscinita “real oficial” era um ponto um pouquinho mais a frente do que tinha conhecido no dia anterior. Havia escombros de uma estrutura para receber banhistas. Por isso, as rochas naturais se misturavam com partes de concreto. Posteriormente, li que um furacão havia destruído essa estrutura há pouco tempo. Ainda assim, as pessoas, em menor quantidade, vão para banhar ou fazer mergulho. Nesse dia, quando chegamos, já havia quatro pessoas. A água é tão cristalina que é possível ver o fundo, mesmo não sendo exatamente raso, e isso torna o lugar bastante convidativo para um mergulho. Ana, agora sem celular, pegou seu esnórquel semiprofissional e sua máscara de mergulho e tchibum n’água, gastando uns bons minutos deslizando no mar caribenho (vídeo aqui). Depois, no outro dia, tivemos descobertas não muito agradáveis. A primeira foi que Ana havia esquecido todo o equipamento de mergulho (esnórquel e máscara) em La Piscinita. Ficou sem celular e sem esnórquel no mesmo dia. Que azar! A segunda descoberta foi que um turista italiano recebeu uma mordiscada de um tubarão-tigre, naquele mesmo local, em 2022, e foi conhecer Simón Bolívar. Ana sentiu medo retroativo com essa informação.
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La Piscinita, a oficial, San Andrés |
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Ilha de Johnny Cai, parte de trás |
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Acuario e parte de sua ponte móvel vista da ilha de Hayes Cai, San Andrés ao fundo |
O dia terminou com um encontro entre professores do IFTM no CafeCafé. Sim, voltamos. Coincidentemente ou nem tanto (por causa dos bons preços das passagens), Márcia, Renata, Eleide e Carol estavam em um roteiro semelhante ao nosso (San Andrés, Cartagena e Cidade do Panamá). Tinham chegado depois da gente e estavam se preparando para os mesmos passeios que fizemos na ilha. Aproveitaram para pegar dicas e eu fiquei pensando que as reuniões pedagógicas seriam mais produtivas se servissem mojitos e limonadas de coco.
5. Nesse dia, por ser o último e termos que pegar um voo para Cartagena à tarde, resolvemos ir para a praia central, Spratt Bight, e relaxar. Ana experimentou várias marcas de cervejas colombianas: Tres Cordilleras, Andina, Poker, Club Colombia e Modelo. A melhor foi a última, mas, também, a mais cara. Um detalhe para quem gosta de enxugar é que o preço da cerveja em San Andrés não é caro. Uma latinha fica entre 4,00 a 6,00 reais. Mais barata do que em Cartagena e em Bogotá. Além disso, em Bogotá, os seres humanos perderam qualquer juízo moral e bebem cerveja em temperatura ambiente. O que dizer sobre a praia de Spratt Bight? O mar é o mesmo, continua lindíssimo. Mas a praia é do perfil turista padrão (o famoso turistão). Percebi que a areia grossa não era exatamente areia como é no Brasil. Parecia muito mais microrretalhos e estilhaços de conchas. Isso faz todo o sentido porque não é uma areia do tipo que gruda eternamente em você. Antes de partir, Ana experimentou o ceviche caribenho (de camarão), outro prato muito consumido por aquelas bandas. Passo longe porque não me apetece carne crua. Ela curtiu.
Cartagena
Chegamos em Cartagena quase às onze da noite. Acostumados com o ritmo tranquilo e a vida relativamente pacata de San Andrés, tivemos uma grande surpresa ao descer do táxi. A cidade estava borbulhando de caos. Frenesi total. Carros subindo nos meio-fios das vielas, um velho cortando o cabelo no meio da rua (não é força de expressão), gente correndo fantasiada com roupa irlandesa… muita música, comida de rua, movimento, ruas enfeitadas com bandeirolas coloridas, como se fosse uma festa junina, casas antigas de estilo colonial, também coloridas. Rappers fazendo letras com os turistas e tentando arranjar uns trocados, como os repentistas de Olinda. Estávamos em Getsemaní. Não era o centro histórico, mas duas ruas a oeste do centro, também dentro da cidade amuralhada. Nosso hotel ficava em uma das ruas onde a muvuca estava rolando. Aproveitamos para “jantar”. Peguei um salsichão (lá ele!) que, inicialmente estava bom, mas depois ruim, rançoso. Ana comeu uma arepa vegetariana com abacate e ficou mais satisfeita.
6. Nesse dia, tomamos um desayuno nada bueno no hotel. A arepa parecia, nessa ocasião, um cuscuz sem graça. Não tivemos que pagar por isso, mas rolou uma gorjeta, que eles chamam de propina. Insatisfeitos, saímos para bater perna. Todos os monumentos e pontos turísticos eram próximos do raio de onde estávamos hospedados (menos de 2km). A primeira parada foi na Torre del Reloj. É uma obra do século 19 na qual existem três arcos/portais e uma torre com relógio (como diz o nome) coloridos de amarelo-açafrão no meio de uma vasta praça. Ao atravessar os portais, chega-se a um pequeno mercado municipal e barracas de ambulantes. No caminho você é abordado por dezenas de pessoas oferecendo mil coisas, desde passeios turísticos a lembrancinhas. Vale destacar que, em Cartagena, há muito mais assédio turístico do que em San Andrés. A todo momento e em todo lugar estão dizendo “adelante” e “a la ordem”. E você que fique esperto, pois se for simpático e der muita atenção, vai acabar comprando o que não quer e por um preço suavemente abusivo. Mas basta agradecer e seguir seu caminho que te deixam em paz (na maioria das vezes). Se caminhássemos à frente, a oeste da torre, encontraríamos alguns museus e outra praça grandona, mas decidimos voltar para leste.
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Praça e Torre do Relógio |
Já era próximo do meio-dia quando atravessamos a ponte Heredia Viejo, na calle 30, com destino ao castelo de San Felipe de Barajas. No caminho deu para notar o contraste social em Cartagena. De um lado da avenida, gringos europeus e estadunidenses trajando roupas de gringos europeus e estadunidenses. Do outro, colombianos em situação de rua, dependentes químicos e pescadores. Levando em consideração o histórico da América Latina, toda a espoliação colonial sofrida, a desestruturação política e a dependência econômica, não poderia ser diferente, afinal, a Cartagena colombiana (existe uma espanhola) possui quase 1 milhão de habitantes. Ainda assim, a cidade amuralhada e adjacências, isto é, a parte turística em que está localizado o patrimônio histórico, fica dentro uma bolha social. Ao passar de ônibus por outros bairros (em outro dia), foi possível observar como a infraestrutura e o saneamento básico é precário e a pobreza é flagrante. Não muito diferente de uma cidade grande ou média no Brasil. Quanto ao castelo de San Felipe de Barajas, é gigantesco, imponente, incontornável, mas dizê-lo bonito é um exagero. Está mais para uma fortaleza e de fato o é também. A fortaleza em si foi construída em 1536 para conter os ataques piratas e invasões estrangeiras ao que os europeus chamavam de Índias Ocidentais (daí o nome da cidade: Cartagena de Índias). Cerca de um ano depois foi finalizada a construção do castelo. O edifício esteve envolvido em diversas guerras e seu nome é uma homenagem a Filipe IV da Espanha (e III de Portugal), o último rei ibérico. Ao chegar na entrada do castelo havia um tumulto turístico: filas, vendedores, táxis, sol quente (faz muuuito mais calor em Cartagena do que em San Andrés, pelo menos essa é a sensação) e preços salgados. O ingresso de acesso ao monstro de concreto era próximo de 50,00 reais. Resolvemos deixar para lá. Quem gosta de castelo é o Mário Bros, não é mesmo? Então não posso dizer se vale a pena entrar. Contudo, ao darmos a volta a pé, contornando parte do castelo, me lembrou a Fortaleza de São José de Macapá. Se assim o for, não vale nem 20,00 reais.
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Castelo de San Felipe de Barajas, Cartagena |
Em razão do calor causticante, entramos em uma loja com ar-condicionado, cujo nome era Museu do Chocolate. Lotada de turistas como a gente, fugindo do calor. Além de produzir bons cafés, a Colômbia também faz bons chocolates. Nesse dia pegamos uma degustação que estava aprazível. Mas o melhor chocolate foi comprado em Bogotá, com mirtilo (arandanos, em espanhol). A experiência negativa com o sol a pino na moleira, nos fez regressar ao hotel e esperar a temperatura diminuir para sairmos novamente. No caminho ainda paramos um pouquinho no Parque Índia Catalina. Não era exatamente um parque. Na realidade, na Colômbia qualquer praça com área verde e laguinho, chama-se “parque”. Pois bem, nesse espaço havia o Monumento Índia Catalina, uma estátua esculpida (corpo esbelto seminu), inaugurada em 1974, em homenagem à lendária indígena que trabalhou como tradutora para os espanhóis durante a colonização e que é símbolo da miscigenação cultural da Colômbia. Não sei, acho que uma estátua dessas geraria muito mais polêmica se fosse no Brasil de agora.
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Parque Índia Catalina, Cartagena |
Gostaríamos, neste dia, de ver o pôr-do-sol em cima das muralhas de Cartagena. Todavia, nos atrasamos para sair do hotel e para buscar o celular de Ana no conserto. Sim, ele teve salvação por uma bagatela de 500,00 reais. Trocaram tela e outras paradas. Enfim, quando chegamos às muralhas, o sol já havia se despedido. Mesmo assim, gastamos um tempo lá, contemplando o mar à nossa frente. Contudo, foi outra cena que entregou o contraste, agora, temporal de Cartagena. Estávamos em cima de uma obra construída com rochas oceânicas no período colonial e cujos 11 quilômetros de extensão demoraram dois séculos para serem finalizados. Ao lançar o olhar a uns 200 metros, víamos uma avenida pavimentada tão longa quanto a imensa fila de carros que se encaixavam, como as pedras da antiga muralha, em um engarrafamento aparentemente comum no horário de pico. O passado e o presente. A época colonial e a modernidade.
7. Em comparação com outros dias da viagem, esse foi sossegado. Tomamos um café da manhã na rua, o mais barato de todos, porque o pão (um tipo de croissant) foi comprado na padaria e o café na rua mesmo (10,00 reais tudo). Acho que foi o primeiro bom café sem açúcar que tomei na vida. Do café fomos ao Parque Centenario, que fica bem pertinho da Torre do Relógio, mas que não havíamos dado atenção. Esse parque realmente tem cara de parque, mas é pequeno. No centro dele há um obelisco que é a estátua de um condor do andes, representando a liberdade. O destaque do parque são os animais. Alguns bichos-preguiças, saguis, carrapateiros (aparentemente) e marias-mulatas que aceitam bastante aproximação. A maria-mulata (chamada no Brasil de iraúna mexicana) é uma ave da família do pássaro-preto, que nos acompanhou em todos os lugares nessa viagem enquanto estávamos na região do Caribe. Depois do parque, atravessamos a Praça do Relógio novamente e fomos mais adiante, onde encontramos uma praça ainda mais ampla, Plaza de la Aduana. Seguindo a oeste, avista-se alguns museus: Museo de Arte Moderno de Cartagena, Museo de San Pedro Claver e Museo Naval del Caribe. Não visitamos nenhum, pois nossa intenção era explorar os museus de Bogotá, que nos disseram ser mais interessantes. De toda forma, para ter uma ideia de preços de ingressos, o museu de arte moderna custava 35,00 reais. O de São Pedro também. Ao lado desse museu, fica o Santuario de San Pedro Claver. Uma igreja construída no século 16, muito bonita por fora e que lembrou uma igrejinha que havia visto em Puno, no Peru. Já com o sol forte, voltamos a Getsemaní para almoçar em um restaurante popular, bom e barato. Experimentei o tradicional arroz com coco e patacones, que nada mais é do que bananas verdes fritas. Gostei do arroz, mas muito diferente ao do Brasil por ser adocicado.
Desta vez, com cervejinhas à mão, conseguimos assistir o pôr-do-sol em cima das muralhas de Cartagena. Quanto a elas, há trechos mais estreitos onde, de fato, uma pessoa poderia caminhar sem dificuldades. No entanto, a maioria é bastante ampla, capaz de acomodar uma multidão. Essa característica é especialmente útil em tempos de guerra, permitindo a movimentação de canhões móveis. O que dizer sobre o pôr-do-sol? Sou o chato que acha superestimado o tal crepúsculo. É bonito? É, sim. Afinal o sol se põe no mar. Mas nada demais. Acredito que, no caso de Cartagena, tenha uma aura especial em razão de estar em cima das muralhas de uma cidade histórica. Seja como for, faz bastante sucesso entre os turistas. Vai muita gente para as muralhas nesse horário. Há um ou dois bares, super caros, que ficam em cima das muralhas e que servem aos burgueses safados.
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Pôr-do-sol nas muralhas de Cartagena |
8. Um passeio que eu, particularmente, gostaria muito de fazer aconteceu nesse dia: visita ao Aviário Nacional da Colômbia. Ficamos um pouco assustados com o valor de um táxi para o local (350,00 reais), mas, no fim, fechamos um passeio com uma agência turística, que ficava mais em conta e passava no Aviário e depois nos levava para a Praia Branca da ilha de Baru (90,00 para cada), com almoço incluso. Acontece que era um domingo e essa praia é bastante popular, abundantemente frequentada por turistas e por moradores de Cartagena nos fins de semana. Não contávamos com esse detalhe. Por volta das 8 da manhã nos dirigimos do hotel ao Monumento dos Pegasus, em frente à Torre do Relógio, onde esperaríamos um ônibus (cuja descrição numérica apenas nos foi dada minutos antes). O ônibus atrasou meia hora em detrimento de nossa ansiedade de ter compreendido alguma informação incorreta, já que nosso portunhol não é exatamente afiado. Mas, enfim, estávamos na Colômbia caribenha, onde o ritmo temporal é outro que não o do cronômetro. O ônibus vai ziguezagueando por vários bairros ao longo do caminho e apanhando pessoas. Para. Espera. Para. É lento. 40km e mais ou menos duas horas depois chegamos ao Aviário. Alguns turistas desceram e outros seguiram com o ônibus para a praia. Há essa possibilidade. Depois surge outro ônibus, por volta de meio-dia, para buscar as ovelhas desgarradas.
O ingresso do aviário não é barato. 80 mil pesos para estrangeiros. Uns 110,00 reais. Mas acho que compensou. O aviário é um santuário de proteção, conservação e educação ambiental relacionado a aves. É grande (7 hectares), logicamente muito arborizado e dentro de uma ilha densamente preservada (salvo exceções próximas às praias). Segundo o informativo do aviário, há 170 espécies que vivem nele. Algumas estão lá anilhadas, em áreas cercadas, porque foram resgatadas de contrabando ou trazidas machucadas. Quando estiverem saudáveis e aptas para a vida selvagem novamente, serão soltas. As que não conseguem, ficam e formam o zoológico. Contudo, muitas aves são criadas livres, podendo entrar e sair do parque ecológico. Em um dos setores, por exemplo, vimos um grande bando de flamingos que, como de costume, “bailavam” loucamente para lá e para cá dentro de um mangue. Estas são aves migratórias no aviário. Tivemos sorte de ir na época adequada para encontrá-las. Também livres estavam araras, papagaios, pelicanos, guarás e colhereiros. Em áreas cercadas, vimos muitas saíras e sanhaços (tangaras), junto ao bizarro galo-da-serra-andino. Um passarinho bastante curioso que, ao avistá-lo, você mal sabe onde começa a cabeça. Vimos e ouvimos a cucaburra, uma parente do martim-pescador e que tem um canto assustador. Também em áreas cercadas estavam as corujas e outras aves de rapina, como diversas espécies de gaviões e ela, a estrela do aviário, a harpia. A harpia (também chamada de gavião-real no Brasil) é a maior águia do mundo. Para um pássaro, possui um tamanho assustador: 1 metro. Tinha um casal desse bicho fantástico.
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Galo-da-serra-andino, no Aviário Nacional da Colômbia |
Infelizmente, devido aos atrasos do ônibus, não conseguimos ficar muito tempo no aviário e tivemos que seguir. Depois, percebemos que daria para ir caminhando para a praia (1,6km de sol no lombo). Contudo, o pessoal que organiza o passeio não tem interesse em deixar as pessoas passarem todo o dia no aviário porque lá dentro não conseguem vender bebidas, comidas, passeios, barracas de praia. Só descobrimos isso depois de ter passado pela experiência.
Ao chegarmos na Praya Blanca de Barú, a impressão inicial foi péssima. Na estrada de terra, atrás da praia e no lago atrás dessa estrada, havia toneladas de lixo, principalmente garrafas e sacolas plásticas. O aspecto de sujeira e desorganização saltava aos olhos. A praia, belíssima. Muitas ondas, areia fina, a água com aquela paleta de cores característica do mar caribenho. Entretanto, abarrotada em quantidades absurdas. A mais cheia de toda a viagem e uma das mais cheias que já vi. Muitas famílias e crianças. Bares e restaurantes por toda a orla. Onde havia areia, tinha um bar e/ou um restaurante. Todos os espaços tomados por barraquinhas, mas, mesmo assim, nos ofereceram uma (50,00 reais). A gente andou alguns metros e percebeu que para frente (uns 3km de praia) seria mais do mesmo e corríamos risco de sermos atropelados por uma criança, então retornamos e pedimos o almoço que estava incluso no passeio. Peixe frito com arroz de coco e patacones. Não estava ruim. Depois, caminhamos para o outro sentido, onde havia rochas, menor densidade populacional e ausência de bares. Ficamos sentados por uns bons minutos nessas rochas fazendo digestão, contemplando a beleza do lugar e observando um pelicano pescando.
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Praia Branca do Barú |
Depois retornamos ao restaurante da agência e uma cena nos chamou atenção: havia um pacotinho de pó branco embaixo da mesa ao lado. Naquele momento, a mesa já estava vazia, mas haviam passado por ela moças e rapazes. O pessoal do bar também viu e com o pé enterraram sorrateiramente o pacote. A Colômbia é mundialmente conhecida pelo narcotráfico, em razão dos cartéis de drogas dos anos 80 e 90, principalmente o cartel de Medellín e o chefão Pablo Escobar. Todavia, foi a única vez que vimos ou ouvimos falar sobre drogas ilícitas na viagem. Quando viajei com meu primo João Gabriel para o Peru, por exemplo, fomos abordados diversas vezes por pessoas oferecendo drogas, em Cusco e em Lima. Isso não aconteceu na Colômbia. A despeito disso e talvez por uma questão turística, a figura de Pablo Escobar vende mais camisetas e lembrancinhas do que a de Che Guevara.
Quando o ônibus nos deixou no Monumento dos Pegasus, peguei minha câmera fotográfica e fui sozinho para a lagoa, próxima ao castelo, onde tinha visto uma águia-pescadora. Não a encontrei, mas fiquei mais à frente, no “parque” Rafael Calvo tirando fotos de garças e pelicanos enquanto o sol se punha a leste. Ao retornar para o hotel, descobri vielas ainda mais estreitas no bairro de Getsemaní com diversas decorações temáticas, com bandeiras nacionais, com guarda-chuvas, etc., onde apenas pedestres podem circular. Havia também uma pracinha (Plaza del Pozo) onde daria para beber um mojito sentadinho (anda-se muito na Colômbia, uff!) em meio ao caos cartaginês. Assim o fizemos mais tarde, na ocasião organizamos a segunda reunião pedagógica com as colegas professoras. Lugar muito agradável. Recomendo.
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As cores de Cartagena |
Há muito mais lugares, parques, passeios e praias para conhecer em Cartagena ou partindo da cidade. Não fomos porque eram mais distantes (como o Parque Tayrona) ou porque já tínhamos estourado nossa cota de praias em San Andrés.
Bogotá
9. Depois do café da manhã em um restaurante granfino (cortesia do hotel), ainda em Cartagena, partimos para o aeroporto. Dentro de 1h30 de voo estávamos em Bogotá. A capital da Colômbia possui 7,9 milhões de habitantes e situa-se a 2.600 metros de altitude. Desde o trajeto de táxi ao apartamento, que alugamos via Airbnb, ficou visível o quanto Bogotá era diferente das duas cidades caribenhas onde havíamos estado. Ainda Colômbia, mas outra Colômbia. O ritmo malemolente e hospitaleiro do Caribe agora dava lugar à vida acelerada e blasé de uma metrópole. Até as informações no aeroporto eram passadas na velocidade cinco do créu. O clima, outra dimensão. Parece que tínhamos sido teletransportados. Trocamos o sol tórrido de Cartagena pelo frio montanhoso em um lance de horas. Três cordilheiras rasgam a Colômbia. Bogotá está em cima de uma delas, a cordilheira oriental. Entre os dias em que nela estivemos, a temperatura variou entre 22º a 9º Celsius. Não parece tão frio, mas se comparar aos 38º/40º de sensação térmica em Cartagena, o contraste é considerável. A primeira impressão sobre Bogotá (foi a que ficou) é que, como a maioria das cidades grandes, há várias cidades dentro de uma. Quero dizer com isso que há uma diversidade de cenários e paisagens ao traçar suas extensas avenidas. À medida em que o táxi ia avançando, remontava alguma lembrança dos infinitos bulevares de Brasília. Muita arborização. Entretanto, sem aqueles tons pálidos dos edifícios e aqueles gigantescos montes de nada gramados da capital brasileira. Bogotá é cheia de cor, dos grafites, das pichações, das pinturas das construções, das árvores e das peças publicitárias, por isso, parece mais viva a despeito da mistura entre a neblina montanhosa e a poluição que paira no ar, deixando um resquício noir. Por conta disso, lembra algumas caraterísticas de São Paulo, La Paz e Buenos Aires. O frio, o corre-corre, os edifícios antigos. Com efeito, as casas, os edifícios quadrados e o calçamento remetem à colonização espanhola, vem daí a semelhança com outras capitais latinoamericanas. Já o bairro La Candelaria, onde fica situado o apartamento em que nos hospedamos, era alguma coisa entre Cusco e Ouro Preto, mesclado à velocidade frenética da metrópole. Ruas estreitas calçadas de pedras polidas formando tapetes estendidos sobre morros íngremes. Igrejas, museus, muitos museus, feiras, mais feiras, universidades, estudantes, turistas e trabalhadores circulando.
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Rua no bairro La Candelaria |
A sorte de ter chegado durante a tarde em Bogotá nos conferiu a possibilidade de conhecer de cara o principal museu dessa viagem, o Museu Botero, do aclamado artista colombiano Fernando Botero. Botero faleceu recentemente, em 2023, e fez um gesto emblemático antes de partir. Doou todas as obras que possuía para o museu, desde que não fosse cobrada a entrada das pessoas. Foi assim que conseguimos contemplar quase todo o seu catálogo (imagino que alguns foram vendidos) e peças de artistas que Botero guardava em sua residência pagando zero pesos. Na entrada do museu já somos “recebidos” por uma de suas mais famosas esculturas, “A mão”. Aliás, pelo que pesquisei, ele produziu outra “A mão” que fica em Madrid. Seja como for, a escultura de bronze tem 500kg e 2,60m. O cara era uma máquina de produção (mas também viveu muito para isso, morreu com 91 anos), tanto esculturas como telas. O museu devia ter mais de dez salas. Muitas peças e quadros grandes, da altura de uma parede. Além de “A mão”, suas obras mais conhecidas são “Mona Lisa” (sátira de Da Vinci), “Os dançarinos” e “O homem no cavalo”. Percebe-se que faltou criatividade na hora de nomear suas obras. Ele era rigorosamente descritivo nesse momento. Inclusive, há uma versão em escultura de “O homem no cavalo” e mais de uma versão em pintura. Ele gostava de retratar comidas e principalmente pessoas. Até Pablo Escobar foi retratado morto em algumas telas. Mas possuía uma caraterística particular, um estilo. Todo mundo aparecia gordo em suas obras, seja na pintura, seja em bronze ou mármore. Suas obras ficaram conhecidas como “las gorditas”. Não, o artista não era gordo. Entre as peças que colecionava e doou para o museu estão algumas obras de Salvador Dalí, Picasso, Monet, Pissarro, Renoir, Joan Miró e Edgar Degas. Ou seja, muita coisa preciosa. Há muitos museus em Bogotá, mas vale a pena ir nesse.
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A tela "Pajaro pequeño" de Botero, no Museu Botero |
10. Dia de conhecer o Monserrate. Para isso precisamos pegar um teleférico. Fomos caminhando bem cedinho até a estação do teleférico e Ana aproveitou para saborear um café especial em uma cafeteria (Sama). Abrindo um parêntese. Quem gosta de café vai adorar Bogotá. Ela adorou. As ruas de La Candelaria exalam aroma de café em determinados horários. Eu não sou um bebedor de café, mas fiquei com a impressão de que o café colombiano deixa o brasileiro no chinelo. Não sei como é o mercado hoje, mas, no século 19, o café brasileiro era conhecido por ser barato e o café colombiano, por ser gostoso. Fechando o parêntese. Para entrar no teleférico tivemos que pagar uns 45,00 reais e pegar uma breve fila (na volta estava muito maior e uma galera esperando no sol). A viagem no teleférico não tem glamour nem conforto. Colocam o máximo possível de turistas na nave. Vai todo mundo espremido. Eixão de Goiânia. Felizmente, é rápido. Havia também a opção mais econômica pelo funicular (um trenzinho), que estava fechado para manutenção. Monserrate é um morro de 3.152 metros de altitude. Lá no alto tem uma igreja velha que funciona. Tem missa e tudo, a depender do horário e do dia, claro. Há também um restaurante que aparenta ser bastante caro. Aliás, abrindo um disclaimer, na Colômbia tudo é pago, até banheiro. E estrangeiro paga mais caro do que colombiano. A vista do Monserrate é interessante, já que dá para ter uma dimensão panorâmica de quase toda a cidade de Bogotá, por ser realmente alta. Para fazer outros passeios, como uma trilha ou observação de pássaros tem que pagar mais e não é barato (uns 50 dólares esse último). Em todo caso, permitem explorar e caminhar pelos arredores, descendo as escadas dos jardins bem cuidados e visualizando as estátuas de uma mini-via-sacra. Acho que é isso. Outro passeio que envolve igrejas na Colômbia é a visita à Catedral de Sal, que fica na cidade de Zipaquirá, uns 60km de La Candelaria. O ingresso simples custava 165,34 reais por pessoa e teríamos que pagar mais uns 350,00 reais de táxi porque não dá para pegar ônibus em Bogotá sem ter o cartão da Transmilenio (informação que só descobrimos tardiamente). A catedral parece interessante, bonita e diferentosa, mas o preço nos assustou e deixamos para lá. Quem gosta de sal é vaca. E de igreja, pombo.
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Vista da cidade de Bogotá do alto do morro Monserrate |
O passeio em Monserrate não foi lá essas coisas, mas o dia só estava começando. Dava tempo de se decepcionar mais. Brincadeira. Depois da chuva torrencial e ligeira que caiu após o almoço (em Bogotá chovia quase todo dia à tarde), pedimos um Uber com destino ao Parque Simón Bolívar. Esse é o maior dos 150 parques existentes em Bogotá. Mas é aquela coisa que eu já escrevi. Qualquer área verde bem cuidada com um laguinho, os colombianos já correm para chamar de parque. Mas, sim, há muitos “parques parques” em Bogotá. O Simón Bolívar é grandão. 113 hectares. O Parque do Sabiá, em Uberlândia, tem 184. Chupa, Colômbia! Semelhante ao do Sabiá, existe um grande lago onde o pessoal treina caiaque e um busto enorme de Simón Bolívar. E quem foi Bolívar? Um dos principais líderes durante as guerras de independência da América Latina, o primeiro “presidente” da Colômbia e um herói local (com direito a muitos monumentos, praças, ruas e quadros até dentro de restaurantes). Andamos tanto nesse parque que custamos achar a saída. É que só haviam duas. Eu cansado e Ana com frio. Daí tivemos que retornar por onde entramos, depois de receber informações mal compreendidas do funcionário de uma lanchonete do parque. No caminho, Ana puxou papo com um senhorzinho e sua neta, que foram muito gentis e nos levaram para pegar um táxi depois de nos informarem que não seria possível utilizar o transporte público sem carteirinha.
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Monumento no Parque Simón Bolívar |
Ótimo, mas não queríamos pegar um táxi. O que fizemos? Contornamos todo o “L” do quarteirão do parque a fim de encontrarmos uma loja de camisetas de futebol e um sinal de Wi-Fi para pedir Uber. Quando chegamos ao fim do “L” sentido ao Jardim Botânico, quem estava lá? Shakira. “Whenever, wherever..” Não, mentira. O velho e a neta. Devem ter pensado: “esses pobrecitos brasileiros estão perdidos. Dios mio!” Explicamos a eles nossa intenção e nos ajudaram novamente. Em geral, os colombianos foram muito prestativos conosco. Não encontramos a loja de camisetas do Independiente Santa Fé, porém descolamos um Wi-Fi em uma loja de materiais para ciclistas e patinadores. Nesse dia conhecemos o motivo da fama de Bogotá possuir um dos trânsitos mais caóticos e engarrafados da América Latina. O Uber demorou uma vida para chegar e quando a viagem foi finalizada, por curiosidade, perguntei a idade do motorista: 18. Aparentemente fomos transportados por um adolescente que pegou o carro emprestado com o pai. Somente um filho do caos para nos guiar nas trevas. É sobre isso.
11. Não sei você, mas eu cansei da Colômbia. A viagem foi muito boa, mas cansativa. Estou tendo a mesma sensação com esse texto. Provavelmente você, leitor(a), também. Bogotá é a síntese disso. Uma cidade charmosa e convidativa, mas que te dá preguiça ao pensar no trânsito para vencer a distância até os pontos turísticos. Mas, tranquilo, estamos chegando ao fim.
Toda a manhã do último dia em Bogotá foi gasta em um museu recomendado pelo gerente do hotel de Cartagena. Trata-se do Museu do Ouro. A entrada custou uns 10,00 reais e valeria mais. Honestamente, este museu me surpreendeu. Na minha vã ilusão, acreditava que seria algo relacionado a bancos, finanças ou jóias. Nada disso. Seu acervo é constituído por mais de 30 mil peças de ouro e outros metais produzidos pela cultura material dos povos indígenas pré-colombianos. Havia desde artigos mais convencionais, como máscaras e coroas, usadas em cerimônias ou por autoridades indígenas, a animais forjados em ouro. Além de peças de metais, havia outros artefatos que iriam fazer pular de alegria qualquer fã de arqueologia. Chamou também a atenção uma múmia solitária de um líder indígena. Esse é um passeio bastante visual e que, em palavras, é difícil descrever sem a posse do conhecimento técnico específico sobre as peças (meu caso, por óbvio).
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Peça no Museu do Ouro, Bogotá |
O Museu do Ouro era a primeira parada de um roteirinho de pontos turísticos que poderiam ser visitados a pé. A segunda parada foi em frente ao Santuário de Nossa Senhora do Carmo. Uma igreja muito diferentona, em estilo gótico florentino, com toques bizantinos e árabes. O edifício é composto por três naves, sendo a torre principal enorme, piso na cruz latina e o destaque vai para a pintura por dentro e por fora: creme castanho listrado com branco, cores emblemáticas dos carmelitas. Ela foi construída em 1938, embora sua origem remonte ao século 17, onde havia, no mesmo lugar, uma pequena igreja do Carmo. Estava rolando uma missa flopadíssima. Sei não, hein. Acho que essa igreja só serve como ponto turístico arquitetônico.
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Santuário de Nossa Senhora do Carmo, Bogotá |
De lá seguimos para a Casa de Nariño, que é onde vive o presidente. Bem pertinho da igreja. Contudo, ocorria uma manifestação aparentemente de funcionários do setor de trânsito. Toda a área em volta do edifício presidencial estava cercada, com polícias e soldados. Nas rádios dos Uber, críticas ao presidente Gustavo Petro. Parece que a coisa não anda tranquila para ele. Não conseguimos ver o palácio da presidência. Próxima parada, Praça de Bolívar. Uma praça imensa, aberta, sem árvores ou bancos, semelhante a Plaza Mayor de San Francisco, em La Paz. 150 pombos por metro quadrado. De um lado fica a Catedral Principal de Bogotá, do outro, no belo Palacio Liévano, o Senado Federal. Igreja e Estado. No centro, uma estátua de quem? Shakira. Nada. Simón Bolívar. Sempre sendo cagado na cabeça por um pombo. Muitos vendedores e turistas. Na rua ao lado tem uma feirinha. Na de baixo, também. E a de cima talvez também tenha. Há de ter. Enfim, nesse bairro o que não falta é feira.
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Praça Simón Bolívar com o Senado ao fundo |
Vamos seguindo porque a próxima parada é no sentido inverso e um pouco mais longe, Plaza Cultural de la Santamaría, onde havia, antigamente, touradas. Caminhamos cansados e cansamos mais pela calle 10. Já não fazia mais aquele frio em Bogotá. No caminho paramos para ir ao banheiro no MAMBO, Museu de Arte Moderna de Bogotá. Não chegamos a entrar para ver o acervo, talvez deveríamos. Parecia interessante. Mas estávamos com fome e pressa (e Ana com ódio de caminhar e de minhas ideias). Atravessamos o Parque da Independência que me pareceu um local propício para um assalto, mas no pasó nada. O próximo edifício era o Planetário de Bogotá e ao lado a tal praça das touradas. Imagino que tenha sido o Coliseu dos colombianos em alguma época (nunca fui ao Coliseu, mas, pelas fotos, lembra). Infelizmente, descobrimos na porta que não poderíamos entrar simplesmente porque fica fechada o tempo todo, com exceção de eventos em determinadas épocas do ano. Uma pena, porque arquitetonicamente pareceu interessante.
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Plaza Cultural de la Santamaría, Bogotá |
De volta de Uber a La Candelaria, fomos almoçar em um restaurante supostamente de bacanas. Pedimos um prato cujo nome era Pollo a la campesina. Veio um punhado de coisas, meio desordenadas: milho cozido, mandioca, abacate, arroz, frango cozido e um molho não identificado. Servidos enrolados em uma folha de bananeira. Achei chique e pitoresco. O frango estava bom e o restante, normal. O abacate eu considerei deslocado. Mas na Colômbia gostam muito de abacate. Tem banquinha que só vende abacate. De todo modo, para um restaurante granfino, ficou barato. Pagamos 160,00 reais em dois pratos, uma cerveja e uma limonada com cupuaçu, incluindo gorjeta e outros impostos que eles inventam. Comparando com os preços de Cartagena e San Andrés, Bogotá sai muito mais em conta. Para quem curte esse tipo de turismo mais urbano e gastronômico, rola comprar uma passagem para ficar somente em Bogotá por mais dias. Quem sabe daqui uma década nós não voltamos…
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Entrada do MAMBO |
12. Nosso voo estava marcado para próximo do meio-dia, por isso não deu tempo de fazer nada a não ser tomar café, arrumar a mala e se despedir da Colômbia pela janela do táxi: cansados, mas plenamente satisfeitos pelas experiências “desfrutadas”, como dizem os colombianos.