“Três semanas na beira do mar; Só comendo, bebendo e depois
surfar... ♫”
Bem, infelizmente não foram três semanas, foram cinco dias, porém intensos,
aprazíveis e agora saudosos (que valeram por três semanas) rodando em dois
estados, do litoral sul de Pernambuco ao litoral norte de Alagoas. Conto tudo a
seguir.
Recife: a Praia de Boa
Viagem e sobre os tutubas
Embarcados em Goiânia, aterrissamos de madrugada em Recife. Quando
amanheceu demos uma voltinha pela charmosa orla da Praia de Boa Viagem. Como
todos sabem, as praias urbanas do Recife e de suas cidades metropolitanas (como
Jaboatão dos Guararapes) são impróprias para banho e surfe devido aos ataques
(ou seriam acidentes?) de tubarões. Dois meses atrás um rapaz de 18 anos ignorou
as inúmeras placas de perigo e entrou para as estatísticas – que começaram no
início da década de 90 e totalizam por volta de vinte mortes. Como interessado
por tubarões, fiz uma pesquisa rápida para saber o motivo dos ataques. E são
muitas razões.
Os especialistas preferem descrever os casos como
“acidentes” ou “incidentes” porque o tubarão não considera o ser humano como
uma presa, mas, sim, o confunde com uma. Tanto é que não se alimenta de carne
humana (a menos que esteja padecendo de fatigante fome) e geralmente depois da
primeira mordida, ao perceber que a pessoa não consta em seu cardápio, o animal
a rejeita. O problema é que a violência é tamanha e o humano é um serzinho tão
frágil que não resiste à primeira investida. Para se ter uma ideia, entre
banhistas, surfistas e mergulhadores, os últimos são bem menos atacados. Isto
porque o tubarão consegue identificá-lo com antecedência. Já no caso de
banhistas e surfistas, a água pode estar turva, o ser humano pode estar
sangrando ou praticando nado dessincronizado (é sério), o que faz o “tuba”
pensar que se trata de um peixe ferido. Mas vamos às principais razões dos
incidentes. Causas naturais: (1) no litoral de Recife há vários arrecifes, daí
o nome da cidade, formando como que piscinas com água do mar, e muitas vezes os
tubarões ficam presos do lado de cá quando a maré baixa; (2) as águas do
litoral pernambucano são mais quentes do que a média e há extensos manguezais,
o que os atraem para reprodução. Causas por intervenção humana: (1) destruição
dos mangues, onde há todo um ciclo de vida oceânica dependente do mesmo e o
tubarão está obviamente ligado a este; (2) construção de grandes obras na
região berçário de tubarõezinhos, como o Porto de Suape; (3) lixo e descarte de
pesca lançados próximo ao litoral. Vimos algumas pessoas e até mesmo crianças
entrando na água. Quer dizer, as pessoas ignoram as placas.
Porto de Galinhas:
vila badalada e arrecifes a poucos metros da praia
Rodando uns 40km ao sul de Recife, chega-se a Porto de
Galinhas. Lá tem uma vila charmosa e bonitinha, toda ornamentada. Turistas do
mundo todo circulam pelas ruas atrás de artesanato e comida praiana a preços
aceitáveis. O interessante de Porto de Galinhas é a proximidade com que os
arrecifes estão da praia. Logo cedinho os visitantes se dirigem à Praça do
Relógio e recebem uma pulseira gratuita da secretaria do meio ambiente, que
controla o número de gente. Dá para ir caminhando até a barreira de arrecifes.
Ana, minha companheirona de viagens e de vida, fez o percurso. E eu, fiquei em
um arrecife mais próximo, me divertindo com os siris (devo ter alguma dose de
autismo). Pousamos umas duas noites em Porto de Galinhas. Deu até tempo de
visitar um aquário de cavalos-marinhos. Passeamos pela pouco movimentada Praia
de Maracaípe, point de surfistas e passeios de bugues, e dali vimos um belo pôr
do sol. Também fomos à movimentada Praia de Muro Alto, que fica ao norte da
vila. O nome desta praia deve-se à alta barreira de arrecifes, a uns 200 metros
da praia. Alugamos um caiaque para lá chegar, já que a maré estava
relativamente alta. Pegamos um ouriço-do-mar na mão. Que bicho incrível! Seus
espinhos iam se movendo à medida que movimentávamos a palma. De uma cor viva,
roxa, quase reluzente. Com certeza um dos momentos inesquecíveis desta viagem.
Praia dos Carneiros: o
combo turista
Com efeito, todos que vão ao litoral sul de Pernambuco dizem
que a Praia dos Carneiros é uma das bonitas em que estiveram. As longas faixas
de areia, os bancos de areia, os arrecifes, os jardins de coqueiros
pré-cabralinos, a igrejinha beira-mar, o mar esverdeado, as águas quentes e
convidativas... é, realmente, eles têm razão. É tudo lindo. Para se chegar é
preciso percorrer mais alguns quilômetros ao sul. A praia localiza-se no
município de Tamandaré-PE (onde fomos comer uma pizza) e seu nome (Carneiros) é
herança de seus “primeiros” proprietários. Os moradores nos avisaram que o
acesso era unicamente privado, paga-se para entrar. Mas depois notamos que seria
possível ir caminhando pela areia, exatamente da Praia de Tamandaré até lá.
Deve dar uns 2km. Mas só descobrimos isso após pagarmos estacionamento em um
dos restaurantes que dão acesso à praia e então aproveitamos para comprar um
combo-turistão (uns 30 reais), entrada + estacionamento + passeio de Catamarã,
com um punhado de turistas, música regional e um maluco no microfone. O passeio
dura duas horas e não vai muito longe, fica ali, entre o arrecife, os bancos de
areia e o manguezal. No caminho, há uma parada nos arrecifes, em que não dá
para ver nada direito porque tem tanta gente nadando por perto (mas tinha, sim,
tinha peixes-sargentinhos, siris, caranguejos, ouriços e corais). Depois
para-se em um banco de areia, que em 15 minutos desaparece, e em uma prainha
onde ocorre o famoso “banho” rejuvenescedor de argila. É claro que nos
lambrecamos da cabeça aos pés.
Maragogi não é tudo
isso
Polêmica! De uns tempos para cá, Maragogi está bombando.
Todas as agências de turismo vendendo passagem a rodo para suas praias. Fotos
espetaculares. Águas cristalinas, corais brilhantes, peixes astros do cinema
nadando com banhistas, mar verde-azul, um contato imediatíssimo com a vida
marinha. “É o Caribe brasileiro”, dizem. Ana, que já fez curso de mergulho e
adora esta brincadeira, ficou animadíssima com essa parte do roteiro. Até
porque depois que nadou ao lado de uma tartaruga “jamanta” em Ubatuba queria
novas aventuras. E lá fomos nós. Da Praia dos Carneiros direto para Maragogi-AL,
uns 60km, e logo que atravessamos a fronteira do estado de Alagoas, chegamos. A
cidade tinha pouca estrutura, nesse quesito só perdia para Tamandaré. Fomos à
praia do centro e a primeira impressão foi péssima. Praia altamente poluída, um
cheiro nauseante de esgoto. Ok. Pagamos 70 reais cada para o passeio de
catamarã, saindo cedinho, com destino aos arrecifes onde acontecem os mergulhos
e o caribe brasileiro. Dos lugares em que estivemos, foi a costa de arrecifes
mais distante (as galés), uns 30 minutos rumo ao alto mar. A vista realmente era
bonita, melhoraria não fosse pela grande quantidade de pessoas fazendo a mesma
coisa que nós, em outras embarcações, com outras empresas. Mas o mar, bem, o
mar não estava quente como nas praias, nem tão claro como nas imagens e a maré
nem tão baixa como imaginávamos. Peguei um colete salva-vidas para me precaver.
E até me esforcei para aproveitar. Mas não vi graça nenhuma. Tudo o que havia
lá, já tinha visto em outros locais. Contudo os barqueiros estavam como loucos
vendendo fotografias com sargentinhos e minicursos de mergulho. Passei foi um
frio danado n’água. E na hora de voltar ao barco a maré subiu. Sem o colete eu
não teria chegado sozinho. Ana também ficou decepcionada. Bem tentou mergulhar
mais distante das demais pessoas, mas sem sucesso, pois estava passando mal
devido ao balanço do catamarã. Por fim, ficou a sensação de que ou não demos
sorte por causa das condições climáticas (chuva na noite anterior e maré não
tão baixa) ou tem muito photoshop naquelas fotos, talvez as duas coisas.
![]() |
Maragogi sem photoshop |
Como consolação pelas galés de Maragogi, conhecemos as
praias mais bonitas da viagem: Praia de Antunes e Praia da Bruna. Isso foi à
tarde, já na volta. A praia estava relativamente vazia e depois semidesértica.
A água realmente agora lembrava o caribe. Caminhamos até o início da chamada
Ponta de Mangue, onde há umas pousadas rústicas e possivelmente caras. A faixa
de areia dava impressão de ser longuíssima quando a maré está baixa. É onde o
pessoal coloca redes de deitar dentro do mar. Apesar dos pesares, valeu a pena
ter ido a Maragogi.
Cultura e história em
Recife Antigo e Olinda: do maracatu à tapioca
Ficamos um pouco receosos devido às inúmeras recomendações
de cuidado com os assaltos e violência em Recife Antigo e Olinda, por isso no
início da viagem fomos à tarde na parte histórica e nada encontramos de
interessante, pois estava tudo fechado. No domingo à noite as coisas mudaram.
Estava rolando um festival de grafite. Mas também presenciamos o ensaio de uma
fanfarra de maracatu. Um pedaço daquela Recife, rica em arte e cultura, finalmente
me foi apresentado. Para quem gosta de arquitetura colonial, vale a pena
conhecer esta parte da cidade. E a praça do Marco Zero também tem seu charme, é
cheia de gente fazendo performances. Neste dia também havíamos ido de busão ao
museu Ricardo Brennand. Um local gigantesco, distante, bonito por seus jardins
e salas, mas sem tantas obras de arte ou artefatos que valham o ingresso. Mais
cedo passamos em Olinda, e cometemos o mesmo erro de ir cedinho. Tudo fechado.
Deu para contemplar a lindíssima paisagem da cidade do Alto da Sé e também
comer uma tapioca sem igual nas feirinhas. Quando menos me dei conta,
apareceram dois senhorzinhos repentistas fazendo uns versos constrangedores
para mim e Ana, a vista de outros turistas que nos olhavam com risos. E eu sem
um centavo no bolso. As latadas também foram inesquecíveis.
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Escrito em agosto de 2018